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sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

MY NAKED LUNCH



FERNANDO HENRIQUE DE  PASSOS

A David Cronenberg e William S. Bouroughs

Há um mundo de sombras por detrás da estante.
Quero desvendá-lo.
Vibram as paredes animadas- som penetrante
Em que me embalo.

Um macaco azul de pênis vermelho
Cospe-me na testa.
Oiço um escaravelho:
"Hoje há uma festa".

Penumbra sem horas nem minutos:
A minha sombra esguia no soalho
Contorce-se em espasmos absolutos;
Eu estou imóvel; a lamparina arrefece-me o trabalho.

Símbolos caídos no cesto dos papéis:
Devo escrever mais.
Vejo autoestradas onde correm corcéis
Que me forram o peito de jornais.

Um copo de água sobre a mesa:
Cintilação de estrelas mortas:
Uma lua acesa
no estreito quarto de sete portas.

Os sete monstros passam a fronteira: 
Estão deste lado.
Falam comigo da manteigueira;
Sou avisado.

Só quando toca a campainha
É que desperto do pesadelo:
a luz é minha.
(Mas o outro mundo, como esquecê-lo?)

sábado, 9 de fevereiro de 2013

EPÍTETOS PARA UM ASCETA


LUIZ MARTINS DA SILVA

À memória de Clésio Ferreira
(Dos irmãos, Clodo, Clésio e Climério).


Pessoas há que não passam,
Mesmo quando já trespassadas.

Olhar de amigo, lívido lírio.
Olhá-lo óvulo, voo, enlevo calmo.

Ia-se, nado, a braçadas para este Nada.
Que é o Tudo, ou é só um Vale.

Pedir-lhes-emos, agora, licença,
Por imagens, outras percepções.

Pessoas há que nem o são.
Se seres fossem, não doeriam.

Preferem crer, à moda dos cães.
Melhor não ser, a ser vil.

Ocultara-se, já quase casulo
Despregando vida como velcro.

Viver é só um curto invento.
Para enigmas de revelações.


sábado, 2 de fevereiro de 2013

MUSEU DE IMAGENS







LUIZ MARTINS DA SILVA

Não irei apelar sentença
Menor que a de Prometeu,
Ainda que um corvo me escarne
Mais ave que um último adeus.

Se bem lhe apraz, a cabeça,
Se é pouco, quem sabe o pescoço                    
E se já me lavaram os ossos,
Que importa a caverna no tórax?

Atendam-me num último sonho:
De não me arrancarem raízes
(Psiu! Lá, escondo uma Fênix).


Memória não se emascula
Nem no profundo das cinzas,
Simples figuras que sejam.